IMORTAL, ENQUANTO DURE...
Pedro Vicente Costa Sobrinho é natural de Macau-RN. No
entanto, na cidade em que nasceu, residiu por um curto período, pois parte de
sua família deslocou-se para o estado de Pernambuco. No subúrbio de Recife e
interior do estado residiu por dezoito anos, nas cidades de Jaboatão e
Ribeirão, onde freqüentou os antigos cursos primário e ginasial.
Os primeiros contatos afetivos com o mundo do livro
aconteceram aos sete anos, ao ter acesso à pequena biblioteca do seu primo João
Costa. Entre os sete e onze anos, nela pôde ler romances de Michel Zevaco,
Rafael Sabatini, Victor Hugo, Alexandre Dumas (pai e filho), Ponson du Terrail,
Humberto de Campos, Coelho Neto, José de Alencar; obras psicografadas e da
doutrina espírita, além de muita revista, quadrinhos, cinema e fotonovelas:
Grande Hotel, Ilusão, Capricho etc. O alargamento do horizonte de leitura, contudo,
tinha por obstáculo a não existência de bibliotecas escolares e públicas na
cidade, e até mesmo de livrarias. Para superar esta carência, a compra de
livros tinha que ser feita em Recife ou através do sistema de reembolso postal.
Disse o escritor Pedro Vicente: “Na cidade de Ribeirão, consegui adquirir
muitos livros através da Editora Gertum Carneiro, atualmente Ediouro, que
mantinha um bom serviço de remessa através do correio. Lembro-me bem que recebi
obras de Aluisio de Azevedo, Eça de Queiroz, Alencar, Bernardo Guimarães, Lima
Barreto, Émile Zola, Júlio Ribeiro, entre outros. Até os quinze anos, não havia
recebido orientação para a leitura. Lia por hábito tudo que me chegava às mãos,
e assistia muitos filmes, especialmente, western".
Fato importante, em sua trajetória de formação intelectual,
foi ter conhecido, em 1961, o operário Sebastião Ricardo e o poeta Alberto da
Cunha Melo. Através do primeiro, comecei a ler a literatura socialista;
Alberto, por sua vez, revelou-me o mundo da poesia e aproximou-me de jovens
intelectuais que editava o “Dia Virá”, pequeno jornal de circulação mensal em
Jaboatão. “Desse momento, guardo gratas recordações – disse Pedro Vicente -,
pois, daí em diante, envolvi-me em duas frentes: os movimentos sociais e com o
núcleo de jovens poetas e escritores que conviviam no Colégio Estadual e no
jornal “Dia Virá”. Desse núcleo, participavam os poetas Alberto da Cunha Melo,
Jaci Bezerra, Domingos Alexandre e José Luís de Melo, que vieram a constituir o
grupo deflagrador do movimento que ficou conhecido como geração – 65, de
marcante presença no cenário cultural de Pernambuco”.
Muitos foram os livros lidos, porém - disse Pedro Vicente –
alguns deles marcaram profundamente sua formação, sem que isto, no entanto,
tenha qualquer significado de avaliação crítica ou estética. “Posso afirmar que
a Bíblia, que lia desde os nove anos, induzido por minha convivência com
evangélicos; O Morro dos Ventos Uivantes, de Emily Brontë; Judeu sem Dinheiro,
de Michel Gold; e o Manifesto Comunista, que me fez aproximar e filiar-me ao
Partido Comunista Brasileiro. Daí, acredito, a minha compulsão para as ciências
sociais e, consequentemente, para a pesquisa e docência”.
No ano de 1964, em decorrência do golpe militar, foi
compelido a sair de Recife e voltar ao Rio Grande do Norte. Tinha dezoito anos,
e regressava à Natal já na condição de exilado, pois fugira da perseguição
política em Pernambuco, motivada pela sua atuação nos movimentos estudantil
e sindical, e militância no PCB .
O momento histórico era difícil; os duros anos da ditadura
militar estavam iniciando. O ambiente político e cultural em Natal sofrera
profunda alteração. O prefeito Djalma Maranhão havia sido preso e seu mandato
cassado, juntamente com seu vice. Vários políticos tiveram o mesmo destino.
Estudantes, jornalistas, professores, escritores, lideranças sindicais e
trabalhadores foram perseguidos, muitos até foram presos. O clima de
insegurança e desconfiança era dominante, contudo, a década de sessenta fora um
período rico de acontecimentos políticos e culturais no Brasil e no mundo: a
Nouvelle Vague, o cinema novo, a bossa nova, a revista Civilização Brasileira,
o tropicalismo, a revolução cubana, Che Guevara, os Beatles, Woodstock, a
guerra do Vietnam, o assassinato dos Kennedy, o Concílio Vaticano II, o
Encontro de Medellín, Sartre, a atmosfera de Paris e Praga; em sessenta e oito,
a passeata dos cem mil, e também a edição do AI-5 e o início da luta armada no
Brasil, foram fatos dos mais marcantes.
Apesar dos atropelos e perseguições pouco a pouco, a cidade
foi tomando ares de normalidade. O clima generalizado de desconfiança foi, de
certo modo, contido, e certas pessoas do mundo intelectual e político voltaram
a se reencontrar para conversar sobre política e arte.
A livraria Universitária foi um espaço importante, porque lá
se podia adquirir livros e revistas que veiculavam idéias contrárias ao regime
militar, e por meio da variedade e qualidade do seu acervo bibliográfico atraía
pessoas interessadas em história, política, literatura e artes.
Outros núcleos foram destacados por Pedro Vicente: o
Cineclube Tirol, que reunia jovens intelectuais apreciadores de cinema, tais
como Moacy Cirne, Gilberto Stábile, Francisco Sobreira, Alderico Leandro,
Falves, Franklin Capistrano, Bené Chaves, Juliano Siqueira, entre outros,
tornou-se um centro irradiador de cultura e aglutinador de centenas de pessoas
em suas sessões de arte; a Casa do Estudante, após a desarticulação das
lideranças e entidades estudantis, tais como DCE, UEE e UPE e diretórios
acadêmicos, passou a desempenhar papel decisivo na reorganização do movimento
estudantil de oposição ao regime militar.
Diferentemente dos outros núcleos, acima citados, – disse
Pedro Vicente- “no Grande Ponto, na recém-inaugurada Praça Kennedy, um grupo de
intelectuais se reunia informalmente, porém com certa regularidade, para
conversar e discutir idéias sobre política, cinema, música, dança, teatro e
artes plásticas. Deste núcleo que se autodenominou “Geração das Cocadas”,
participaram muitos jovens intelectuais que vieram a assumir posição de
destaque no cenário político e cultural da cidade.” Na verdade, a “Geração das
Cocadas”, a Casa do Estudante e o Cineclube Tirol interagiam; muitos dos seus
personagens circulavam sem fronteiras no interior desses núcleos, que se
constituíram, segundo Pedro Vicente, junto aos partidos de esquerda e o
movimento estudantil, na oposição mais coerente e ativa contra a ditadura
militar no Estado. Realça – Pedro Vicente – que deve muito a esses grupos, pois
tiveram papel fundamental na sua formação intelectual. A sua participação e
envolvimento, com eles, aconteceu logo que voltou a Natal, quando passou a
trabalhar no Departamento Estadual de Imprensa e como revisor no jornal Tribuna
do Norte.
Nos anos de sessenta e cinco a sessenta e nove, Pedro Vicente
destacou sua presença no grupo que reorganizou o Partido Comunista no Rio
Grande do Norte, vindo a participar de sua direção clandestina no Estado, bem
como seu envolvimento com a fundação do MDB. E, também, sua ida a União
Soviética, para estudar, em Moscou, no Instituto de Ciências Sociais, anexo do
Comitê Central do PCUS.
Sua atuação, contudo, não se resumia apenas na atividade
política. Ele participou de vários encontros e jornadas de cinema como membro fundador
da Associação Brasileira de Documentaristas, do Centro de Pesquisadores do
Cinema Brasileiro, e foi presidente da Federação Norte - Nordeste de
Cineclubes. Dirigiu o Centro Acadêmico Josué da Castro, da Faculdade de
Sociologia da Fundação José Augusto e presidiu a Associação dos Sociólogos do
Rio Grande do Norte. Exerceu vários cargos de chefia no Departamento Estadual
de Imprensa do RN. Foi superintendente da tipografia Relâmpago. Diretor da
gráfica Manimbu, assessor cultural e Coordenador da Assessoria Especial da
Fundação José Augusto.
No final dos anos setenta a vida de Pedro Vicente tomaria
outro rumo. Em 1978 foi para o Acre, onde assumiu a Direção Executiva das
Delegacias do SESC e do SENAC. Lá iniciou a carreira de professor do Ensino Superior,
lecionando na Universidade Federal do Acre. Na época era Bacharel em Ciências
Sociais, com área de concentração em Sociologia e Política, pela UFRN. Em
seguida faria Especialização em Economia Rural (UFAC); Mestrado em Ciências
Sociais (Sociologia Política) PUC-SP; e, depois, vindo a obter o título de
doutor em Ciências da Comunicação, na USP. Ainda no Acre exerceu o cargo de
vice-presidente da Associação de Docentes da Universidade Federal do Acre. Na
UFAC, foi Diretor do Departamento de Filosofia e Ciências Sociais e editor das
revistas Cadernos UFAC: Ciência e Tecnologia, Estudos Sociais, e Estudos e
Pesquisas. Além disso, foi livreiro, dono de restaurante, e correspondente do
semanário Voz da Unidade.
Quando retornou ao Rio Grande do Norte em 1992, já como
professor da UFRN no Departamento de Ciências Sociais, foi professor-orientador
no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (mestrado e doutorado). Alguns
anos depois foi chamado a exercer o cargo de Diretor da Editora Universitária,
quando editou dezenas de livros e coordenou duas Feiras Nacionais de Livro do
Rio Grande do Norte, e a Primeira Bienal Nacional do Livro do Rio Grande do
Norte.
Sua atuação cultural, no entanto, se tornou muito ampla.
Lançou sete livros, entre eles: Capital e Trabalho na Amazônia Ocidental
(1992); Reflexões sobre a desintegração do comunismo soviético (1995);
Exercícios circunstanciais. Natal (1997); Comunicação alternativa e movimentos
sociais na Amazônia Ocidental e Vozes do Nordeste (2002). Ver a relação completa
no final do capítulo. Foi integrante do Conselho Municipal de Cultura;
tornou-se sócio-efetivo da União Brasileira de Escritores (UBE) e Instituto
Histórico e Geográfico do RN, e conselheiro do Conselho Estadual de Cultura do
RN.
Sua entrada para Academia Norte-Rio-Grandense de Letras não é
por acaso. No seu currículo constam inúmeras atividades, prêmios e funções na
vida cultural do país. Como cinéfilo e crítico de cinema arrancou elogios de
Ivan Junqueira da Academia Brasileira de Letras: “... gostei muito do que você
escreveu sobre A festa de Babette e O professor aloprado (...) não conhecia
esse seu talento, regozijo-me com a descoberta...”, afirmou o acadêmico. O
professor Pedro Vicente também faz parte da comissão de editoração e conselhos
editorais de diversas revistas culturais e científicas, regionais e nacionais,
entre as quais: revista Cronos, do Programa de Pós-Graduação em Ciências
Sociais da UFRN; revista Estudos de Sociologia, do Programa de Pós-Graduação em
Sociologia, UNESP; revistas do Conselho Estadual de Cultura do RN, Crítica
Marxista (SP), Novos Rumos (SP) e Política Democrática (DF).
Sua relação com a comunicação sempre esteve presente desde a
infância, quando lia as revistas em quadrinhos; quando se tornou cineclubista e
crítico de cinema; quando assumiu cargos de direção no Departamento Estadual de
Imprensa do RN (1964-69); na Tipografia Relâmpago – Natal-RN (1971-72); na
Editora e Gráfica Maninbu da Fundação José Augusto (1973-1974) e quando foi o
editor responsável pelo Programa Editorial da Universidade Federal do Acre
(1990-1991). Por causa disso, sua trajetória profissional e universitária o
levou a fazer doutorado na Escola de Comunicação e Artes da USP.
Logo que conheceu a Academia Norte-Rio-Grandense de Letras,
na década de 70, e alguns dos seus acadêmicos, colocou como um dos seus
objetivos vir a pertencer aos seus quadros. “Fui convidado pelo meu amigo
Manuel Onofre Junior várias vezes para concorrer, porém não aceitei por achar
que não era o momento oportuno, e que não tinha publicado ainda os livros
necessários. Além disso, concorrer a uma vaga na Academia dependia também de
bons e sólidos contatos com seus integrantes. O reconhecimento deles ou de
alguns deles é fundamental”, declara Dr. Pedro Vicente.
Assim, no momento oportuno concorreu à cadeira 31, cujo
patrono é o Padre Francisco de Brito Guerra, e tinha como primeiro ocupante o
professor José Melquíades de Macedo, sendo eleito com 27 votos em 25/7/2002. A
posse ocorreu no dia 26/8/2004. Em sua opinião, a ANL tem no decurso dos seus
70 anos, desde sua fundação em 1936, cumprido o seu papel de instituição
cultural por excelência. “Parte do que houve e que há de mais importante no
conjunto de intelectuais do Rio Grande do Norte, dela participa ou participou”.
“O somatório da produção intelectual dos seus integrantes, científica e
literária, com certeza, tem um peso cultural inestimável na história social e
política do nosso estado, e por extensão do país”. Com sua obra reconhecida em
todo país, Dr. Pedro Vicente colheu vários depoimentos importantes de sua obra,
entre eles, os que seguem abaixo:
OPINIÕES SOBRE O AUTOR:
“... ademais de ser um empenho analítico, este livro é também
um testemunho de solidariedade com uma terra e uma gente que, para Pedro
Vicente, se converteram em sua terra e sua gente”.
José Paulo Netto – ensaísta e professor da UFRJ
“... concluí leitura detida e atenta do seu Capital e trabalho
na Amazônia Ocidental. (...) é seguramente um marco na literatura sobre o
assunto naquelas paragens do nosso país. (...) Enfim não me surpreende como não
surpreende ninguém que conheça a sua inteligência aguda e a sua
sensibilidade...”.
Sebastião Vilanova - professor, sociólogo e ensaísta
Recebi e li, com receptividade empática, os seus exímios
Exercícios circunstanciais, escritos com vigor e rigor, texto fluente e
capacidade de informar sem “fofocalísticas” ou pontificações profissionais.
Marcos de Farias Costa – poeta e ensaísta
“Continuo lendo o seu livro. (...) A variedade temática tem
me agradado bastante. Embora a aridez dos assuntos políticos possa criar certas
dificuldades para os poetas, o livro oferece outras iguarias bem mais
palatáveis. É o caso, por exemplo, do excelente trabalho sobre o filme A festa
de Babette”.
Francisco Carvalho – poeta e ensaísta
“Foi reconfortante constatar que o autor é bom. (...) Fico
feliz por você e pelo Rio Grande do Norte (...) os artigos que têm o cinema como
tema estão ótimos”.
Gilberto Stábile – crítico de cinema
“Ontem à noite me você me proporcionou bons momentos de
leitura. (...) Obrigado Pedro, e obrigado pelo prazer da leitura que o seu
livro Exercícios circunstanciais me proporcionou. Você é um belo ensaísta.
Escreva mais, muito mais, dê vazão ao seu talento”.
Nei Leandro de Castro – poeta e romancista
“Através da leitura do seu trabalho (Comunicação alternativa
e movimentos sociais na Amazônia Ocidental), tomei completo conhecimento dos
trágicos acontecimentos que transformaram, há poucos anos, o Acre em um
território sem Lei, objeto da “invasão” dos pecuaristas “paulistas”. Você
traçou, com maestria, aqueles, conturbados tempos, motivo pelo qual lhe
apresento os mais sinceros parabéns pelo seu trabalho literário.
Olavo de Medeiros Filho – historiador e ensaísta (da Academia
Norte-Rio-Grandense de Letras)
“O trabalho se destaca ainda pelo cuidado empírico de
caracterizar os temas explorados naqueles periódicos e sua materialidade de
imprensa – estilos textuais, imagens, etc. Alia-se a isso a preocupação erudita
de debater uma bibliografia ampla e diversificada e o apelo à documentação”
complementar de grande interesse... A solidez do texto está apoiada, por fim,
na experiência anterior de pesquisa... e em seu convívio direto com muitos
personagens agora estudados”.
MARCOS SILVA – HISTORIADOR, ENSAÍSTA E PROFESSOR DA USP
Nenhum comentário:
Postar um comentário